As cartas trocadas entre Adrian Leverkuhn e seu mestre, sr. Wendell Kretzschmar, são um interessante testemunho do que poderia parecer uma tomada de decisão como resolução de um impasse: que carreira seguir, a de teólogo ou a de compositor? Mas se é o destino que faz alguns nascerem para um determinado ofício, ou, o que dá no mesmo, se é tal ofício que reclama por aqueles que não podem se "dar ao luxo" da escolha, a trajetória que seguem não é algo que poderia caber em deliberações. Não pertence - no sentido de propriedade - a Adrian o desejo pela música e se tornar compositor. Isto que o move é onde está mergulhado, ao mesmo tempo que é dele que esse movimento que o ultrapassa necessita para se atualizar.
"A arte progride e o faz por intermédio da personalidade, que é produto e instrumento da época, e na qual fatores objetivos e subjetivos ligam-se, até se tornarem indistinguíveis, assumindo uns a forma de outros. Devido à necessidade vital que a arte tem do progresso revolucionário e da realização do renovamento, depende ela do veículo do mais intenso sentimento subjetivo, que acha chochos, inexpressivos e obsoletos os recursos ainda corriqueiros e se serve daquilo que aparentemente não é vital, a saber, da predisposição pessoal para a lassitude, do fastio intelectual, do asco que acomete a quem perceba o 'segredo do feitio', da maldita inclinação de ver as coisas à luz da sua própria paródia, do 'senso cômico'. Repito: o desejo de vida e progresso, inerente à arte, põe a máscara dessas tíbias qualidades pessoais para assim manifestar-se, objetivar-se, cumprir-se." (Doutor Fausto, p. 159)
domingo, 14 de junho de 2020
Vontade que ultrapassa
Marcadores:
Arte Contemporânea,
Arte Moderna,
Desejo,
Doutor Fausto,
Música,
Thomas Mann
Assinar:
Postagens (Atom)