NORMALMENTE, o efeito da música 4'33'', de John Cage, naqueles para quem ela é apresentada é cômico. Composta em 1952, ela é constituída de 3 movimentos e dura exatos 4 minutos e 33 segundos. No vídeo da "versão" de David Tudor, as palavras de seu autor que antecedem a apresentação são: "the material of music is sound and silence. Integrating these is composing. I have nothing to say and I am saying it." Cage, deste modo, incorpora à música, pensa como parte integrante sua, o silêncio, diferentemente das considerações acerca da música de tempos anteriores que opunham uma coisa à outra, a música ao silêncio. Ambos, agora, deixam de se excluir mutuamente. Mesmo 4'33'' sendo só silêncio, essa música não é um mero nada: possui bordas, tem um início, é dividida em partes, e termina. Ela equivale às molduras sem tela penduradas nos consultórios dos psicanalistas (mas estarão elas vazias?). Portanto, é isso que Cage faz: nega ao silêncio o seu antigo caráter de nada. Esta é a mudança que o silêncio sofre. Não sendo mais ausência absoluta, ele se torna o contraponto do som. Se o silêncio é negação de alguma coisa, essa coisa não poderia ser outra que o seu contraponto no interior da peça que os estabelece (separando-os) através do arranjo. Uma primeira implicação: desfazendo a identificação — embora espontânea, mas — nada natural entre o silêncio e o nada enquanto negação radical, o silêncio estará necessariamente comprometido com aquilo mesmo que se supunha que fosse o seu contrário. E mais: ele é a sua condição mesma, aquilo que o torna possível. A conseqüência direta é a perda do "lado de fora" da música, do lugar neutro a partir de onde perspectivar a música e julgá-la. Sem tal lugar, como separar o som do ruído? A distinção entre eles se torna, assim, apenas aparente, pois se diferem somente em grau, mas não de natureza. Se se diz que música é a arte de "esculpir" os sons, dever-se-ia antes afirmar que música é a arte de trabalhar os ruídos, inclusive negando-os. A existência dos samplers, hoje, é testemunha disso. Eles permitem à música a inserção de elementos, como determinados sons, ruídos e até diálogos de outras cenas. Tais aparelhos, trabalhando as ondas, modificando tudo o que por eles passa, reduzem à condição de coisa aquilo que, quando bem combinado, nos eleva às mais superiores esferas da sensibilidade. O silêncio e o ruído não são mais limites opostos (e externos) no intervalo dos quais se faz música. O silêncio deixa de ser nada, negação, ausência; e o ruído, por sua vez, deixa de ser desordem, confusão, indistinção, caos.
OUTRA hipótese é considerar que a música 4'33'' de Cage seja o instante prolongado ocupando plenamente o espaço entre dois únicos tempos num andamento de 0,23094688221709 BPM (Beats Per Minute). A extensão da duração entre o primeiro e o segundo (último) tempo seriam os exatos 4 minutos e 33 segundos. Já as paradas que intercalam as suas três partes, os momentos de retomada do fôlego. O gênio de Cage foi justamente destacar pelo recorte o que se achava que fosse apenas vazio, cercando com a determinação de um tempo e fixando através de um nome — nome que não passa de repetição do quanto tempo dura esse "ruído branco", o silêncio. Quando o som é subtraído e o silêncio que o entremeia se dilata, o que resta, mais que a matéria do silêncio, é a experiência pura do tempo, que em alguns causa tédio (por este motivo ela é dividida em partes para a recuperação do fôlego) e em outros, riso. Cage criou a música sem os relevos que o jogo do som e do silêncio poderia gerar, e justamente porque sem tais relevos que permite que se escute o próprio tempo.
JOHN CAGE - 4'33''
OUTRA hipótese é considerar que a música 4'33'' de Cage seja o instante prolongado ocupando plenamente o espaço entre dois únicos tempos num andamento de 0,23094688221709 BPM (Beats Per Minute). A extensão da duração entre o primeiro e o segundo (último) tempo seriam os exatos 4 minutos e 33 segundos. Já as paradas que intercalam as suas três partes, os momentos de retomada do fôlego. O gênio de Cage foi justamente destacar pelo recorte o que se achava que fosse apenas vazio, cercando com a determinação de um tempo e fixando através de um nome — nome que não passa de repetição do quanto tempo dura esse "ruído branco", o silêncio. Quando o som é subtraído e o silêncio que o entremeia se dilata, o que resta, mais que a matéria do silêncio, é a experiência pura do tempo, que em alguns causa tédio (por este motivo ela é dividida em partes para a recuperação do fôlego) e em outros, riso. Cage criou a música sem os relevos que o jogo do som e do silêncio poderia gerar, e justamente porque sem tais relevos que permite que se escute o próprio tempo.
JOHN CAGE - 4'33''
Muito legal o texto!
ResponderExcluirO melhor de tudo é que essa eu posso executar. rsrs
Abração
Um aluno de violão me disse, na sua primeira aula, que não sabia tocar música nenhuma. Então eu respondi que ele sabia tocar pelo menos uma música. Ele me perguntou qual. Eu respondi 4'33'', de John Cage, que bastava ele não fazer nada que a música já estaria sendo executada. rsrs
ResponderExcluirUm abraço!!!!!