“O governo dirá que não proíbe arte, que não está prendendo ou interrogando autores, que artistas são perfeitamente livres para expressar suas ideias, suas sexualidades e suas religiões, que não existe mais um departamento de censura, não existe mais o cargo de censor, que o Estado não pretende impedir a difusão de obra alguma. Ao contrário do passado, o Estado apenas se reserva o direito de não financiar artistas e temáticas que estejam em desacordo com o projeto que foi feito nas urnas pela maioria do povo. Ao contrário da censura, a suspensão do edital é democrática.
Pois é exatamente aí que vive a essência da censura, onde o cancelamento de um mero edital se iguala à censura mais escancarada e abre o precedente para que ela se institucionalize e que podemos não perceber a gravidade, o tamanho do risco, se cometermos o erro de encerrar o debate sobre a liberdade de expressão como um choque entre o Estado e os autores. E esse é um erro muito comum, porque em uma sociedade tão focada no indivíduo, no ego da autoria e na obsessão com o protagonismo do autor, é natural que a gente deposite o valor da liberdade de expressão no direito sagrado do indivíduo de dizer o que quiser, de artista ter o direito de veicular livremente suas ideias. Mas, como artista, eu digo que esse é um valor secundário, é o de menos no princípio da liberdade de expressão tão fundamental para a democracia. O artista, no fundo, é coadjuvante de uma história maior, pois o maior valor da liberdade de expressão é o público: é mais sobre o direito de escutar do que sobre o direito de dizer, é o direito do público, do espectador, ter acesso a ideias variadas, inclusive aquelas diferentes das que ele já conhece e aprova. E aí, na autonomia do público, no seu direito de ser exposto ao novo, ao desconhecido, que reside a importância cultural e democrática da liberdade de expressão.”
Pois é exatamente aí que vive a essência da censura, onde o cancelamento de um mero edital se iguala à censura mais escancarada e abre o precedente para que ela se institucionalize e que podemos não perceber a gravidade, o tamanho do risco, se cometermos o erro de encerrar o debate sobre a liberdade de expressão como um choque entre o Estado e os autores. E esse é um erro muito comum, porque em uma sociedade tão focada no indivíduo, no ego da autoria e na obsessão com o protagonismo do autor, é natural que a gente deposite o valor da liberdade de expressão no direito sagrado do indivíduo de dizer o que quiser, de artista ter o direito de veicular livremente suas ideias. Mas, como artista, eu digo que esse é um valor secundário, é o de menos no princípio da liberdade de expressão tão fundamental para a democracia. O artista, no fundo, é coadjuvante de uma história maior, pois o maior valor da liberdade de expressão é o público: é mais sobre o direito de escutar do que sobre o direito de dizer, é o direito do público, do espectador, ter acesso a ideias variadas, inclusive aquelas diferentes das que ele já conhece e aprova. E aí, na autonomia do público, no seu direito de ser exposto ao novo, ao desconhecido, que reside a importância cultural e democrática da liberdade de expressão.”
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