Reclamam do fato de os episódios do desenho Papa-Léguas serem todos iguais. Mas não poderia ser de outra forma, uma vez que aquilo que o coiote persegue, o Papa Léguas, é em si mesmo inatingível. Por que? Um tem mais velocidade que o outro quando se perseguem? Tal resposta não é boa e não dá conta do que realmente acontece. Na verdade, o Papa-Léguas não existe senão na cabeça do coiote que o caça. E essa interpretação não é absolutamente aleatória. Percebe-se isso numa das mais comuns armadilhas contra o Papa-Léguas, a do desenho de um túnel feito na pedra pelo próprio coiote. Quando o Papa-Léguas segue a estrada a toda velocidade e entra no túnel esperávamos que ele se chocasse contra a pedra em que o túnel fora desenhado. Mas isso não ocorre. O Papa-Léguas atravessando o falso túnel na pedra revela que ele é regido apenas pelas leis daquele cenário e daquela simulação de realidade. Quando o coiote tenta fazer o mesmo esse sim se depara com a dureza da pedra, pois as leis da natureza a que está necessariamente submetido (por exemplo, que dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço) não são as mesmas do Papa-Léguas. Se o coiote imaginou um túnel quando o desenhou na pedra, o Papa-Léguas enquanto um ser igualmente fruto de sua imaginação – ou melhor, de seu delírio – é plenamente capaz de atravessá-lo. O desenho na pedra e o bicho perseguido são feitos da mesma "matéria", por isso se interagem. O programa Papa-Léguas diz respeito, portanto, a um animal solitário que delira no meio do nada, um coiote que persegue algo criado por sua loucura num deserto, num lugar vazio. Há nisso alguma lição? O que na nossa vida diária encarna o Papa-Léguas e nos motiva a levantar todos os dias? Dinheiro, mulher, felicidade...? Acreditar que essas coisas existem de fato e que devemos correr atrás delas isso só nos leva a dar com a cara contra a pedra, como acontece sempre com o coiote.
Logo abaixo uma seqüência que ilustra bem a ideia central do desenho:
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