Ora, tampouco visa referir-se ao Ser por trás, suporte inteligível do que se vê. O Ser é tradicionalmente da alçada da filosofia. Na tentativa, então, de uma formulação do problema das artes dos tempos atuais, não é exagerado dizer que é o Real de que se trata. E Real não é o mesmo que Ser. Aliás, o surgimento da dimensão do Real só foi possível à custa da perda mesma do Ser. Se na metafísica Ser e Real coincidem, com o fim desse modelo de pensamento desaparece do horizonte o Ser, tornando por este motivo menos suscetível o Real a encobrimentos míticos. Tanto cores e formas regidas pelo princípo de semelhança quanto aqueles discursos que têm a designação como intenção nos aproximam do mito na mesma medida que nos afastam do Real. Não caberia, portanto, às artes, ao menos àquelas que não se prestam a fins de enfeite, o esforço de tocar o Real?
Uma das responsáveis por essa separação entre Real e realidade foi a invenção da fotografia. Com o advento da possibilidade da fixação da imagem através de um meio mecânico, o que ocorre? É aberto um fosso entre representação e referente, o que revela que a realidade vista é também signo, é imagem.
A seguir, dois trechos de dois autores onde tais ideias se concentram:
"Ao cumprir a pauta realista com precisão quase absoluta, a fotografia acaba por abrir uma crise sem precedentes na história da mímesis. Entre a representação e o referente não há mais a distância segura que a pintura tentava ultrapassar. De um só golpe, é a realidade que é posta em questão: seria ela apenas imagem? O real se distancia até se tornar inatingível, enquanto a imagem assume a dupla e paradoxal função de mostrá-lo e escondê-lo ao mesmo tempo." (Tânia Rivera, O Avesso do Imaginário, pg. 53)