FALAR de um livro para alguém que não o tenha lido é sempre muito difícil. Ao mesmo tempo que não conseguimos guardar para nós a beleza do que nos foi trazido pela leitura, os adjetivos que usamos na tentativa de transmitir a impressão que a obra nos causou se mostram impotentes. Esta angústia entre a necessidade de expressão e a impossibilidade da mesma posso sentir com toda força nos períodos que leio Em Busca do Tempo Perdido, de Marcel Proust. Por esta razão, o que hoje escolhi deste autor na minha opinião exprime o que em sua obra é de grande importância e de difícil conversa: a ligação necessária dos amores aos lugares, isto é, dos sentimentos aos espaços. Isso ficará claro através do trecho citado do livro logo a seguir. Da noção comum de neutralidade do espaço (simples receptáculo vazio dos corpos, aquilo que confere extensão às coisas) à de determinação do que a ele não se reduz, que é o próprio sujeito e seus afetos. Qual será a natureza desta relação? As cartas de amor em geral começam falando de tudo o que cerca os amantes, como a música que tocava no momento do primeiro encontro, as árvores do local, as novas cores trazidas à vida pelo dia tão milagroso e único. Quase como um simples detalhe em meio a este cenário, o objeto amado, aquela(e) à luz de quem tudo adquire nova significação e brilho, como que um elemento fora da série mas condição de possibilidade dessa série mesma. Por isso, a pergunta: quando se ama, ama-se alguém ou a um cenário? Será aquela(e) que se ama o álibi de um desejo ainda mais profundo, que é o de se perder na dissolução e coincidência total com um lugar que se gosta de estar?“Mas se esse desejo de que me aparecesse uma mulher acrescentava aos encantos da natureza algo de mais excitante, os encantos da natureza, em troca, ampliavam o que poderia haver de demasiado restrito no encanto feminino. Parecia-me que a beleza das árvores era sua beleza e que a alma daqueles horizontes, da aldeia de Roussainville, dos livros que eu estava lendo, seu beijo ma revelaria; e como minha imaginação recobrava forças ao contato de minha sensualidade, e minha sensualidade se expandia por todos os domínios de minha imaginação, meu desejo não tinha mais limites. É que também a passante que meu desejo chamava afigurava-se-me não um mero exemplar desse tipo geral, a mulher, mas um produto necessário e natural daquele solo. (...) Vagar assim pelos bosques de Roussainville sem uma camponesa a quem beijar, era não conhecer o tesouro oculto daqueles bosques, sua beleza mais profunda. Aquela rapariga que eu imaginava sempre rodeada de folhagens era também como uma planta local, apenas de espécie mais elevada que as outras e cuja estrutura me permitisse sentir, muito mais de perto que as demais, o sabor profundo da terra.” (Marcel Proust, No Caminho de Swann, Pp. 201, 202)
(BRUNO HOLMES CHADS, 12 de julho de 2009)
(BRUNO HOLMES CHADS, 12 de julho de 2009)
Muito bom.
ResponderExcluirgrata,
Lacrimae Paz - http://reflexoesnotivagas.blogspot.com.br
[...]meu desejo não tinha mais limites[...] M.Proust