segunda-feira, 13 de julho de 2009

Poe e a sua sentença

AS POUCAS palavras hoje postadas são do escritor Edgar Allan Poe. Elas estão em seu famoso conto O poço e o pêndulo. É interessante notar o que perde aquele que nos narra a história após saber da fatalidade que espera por ele: perde o poder de significação que as palavras exercem. A última coisa possível de se ouvir é a sua própria condenação, pois a partir deste momento tudo é barulho e excessivamente material: o que resta das palavras é o seu puro som. E esta voz bruta, desprovida de sentido, o leva à perda de critérios para julgar se o que lhe aparece resulta de delírio ou se vale por si mesmo. Em seguida, temos a vertigem do "moinho", cuja associação teve como causa o ruído dos confusos sons que produziam as bocas sem corpos daqueles que o condenavam. Se lá havia corpos, estes eram sem substância, como as suas vozes sem a ancoragem de um sujeito. Mas o que aqui nos interessa é: quem são tais juízes por cujas bocas a “terrível sentença de morte” chegava aos ouvidos do condenado? Que malditos lábios proferiam tal verdade? Nada é mais certo que o fato de serem eles todos mortos se considerados a partir do mundo (o do narrador) que também está sendo sentenciado à morte junto a seu representante retardatário: o mundo e o homem antigos cedendo lugar a um mundo e a um homem novos. Poe, como Baudelaire e mais tarde Proust, é a expressão na literatura de uma profunda mudança que se deu de forma lenta e gradativa. A vertigem referida é a do desaparecimento da possibilidade de defesa de um fundamento ontológico: o infeliz do conto sente a vertigem nele mesmo, no interior de si; experimenta a morte antes mesmo de ter que morrer. Deslocamento, portanto, do vazio, do nada fundamental, da “noite do mundo” (como nos diria Hegel), da negatividade absoluta, que antes pertencia a um lugar seguro além das fronteiras da esfera da vida para, agora, habitar em seu interior, em seu núcleo. Há quase exatos dois séculos vida e morte deixam de se separar por fronteiras nítidas e reais. Quando se vai ao cume da vida, ao seu mais íntimo, ao invés de lá encontrá-la em sua pulsante efervescência (o espírito puro ou a centelha divina), isto com o que se deparará será o seu exato oposto: o nada, um vazio desesperador, a morte já presente e triunfante antes mesmo de sua chegada derradeira. Vamos ao texto:

“A sentença – a terrível sentença de morte – foi a última frase que chegou, claramente, aos meus ouvidos. Depois, o som das vozes dos inquisidores pareceu apagar-se naquele zumbido indefinido de sonho. O ruído despertava em minha alma a idéia de rotação, talvez devido à sua associação, em minha mente, com o ruído característico de uma roda de moinho. Mas isso durou pouco, pois, logo depois, nada mais ouvi.”

Um comentário:

  1. Adoro Poe
    Em los angeles, quando estudei na Bert Lynn Middle School (12anos), já tinha aulas de literatura, e durante o ano, dentre vários livros que digerimos naquele ano, 2 foram de contos do Edgar Allan Poe... muito bom... saudoso...

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